Era uma vez uma
menina que se sentia muito solitária. Não tinha amigos, os colegas na escola
não gostavam dela e até mesmo faziam piadas da coitadinha. A menina andava
sempre de queixo caído, nunca sorria, não saía do seu quarto e chorava muito
durante as noites. Nem os livros, nem os filmes constituíam uma fonte de
alegria para ela. Os pais alarmados ficaram preocupados. “O que é que podemos
fazer?”, perguntaram ao psicólogo conhecido e ouviram uma resposta muito
simples e surpreendente: um cão. Fizeram o que lhes foi aconselhado.
Primeiro, viram um
anúncio onde uma família oferecia os cachorros rafeiros. “Para as pessoas boas que
podem dar aos cãezinhos uma casa cheia de amor”, assim figurava o conteúdo
da mensagem. Os pais foram em segredo, sem dizer nada à menina. De entre cinco
pequenos seres escolheram uma bola preta tão fofa, como se só pudesse imaginar.
Levaram-na para casa. O cachorro passou os seus primeiros minutos no novo lugar,
“visitando” e cheirando todos os quartos da casa. A menina ainda não tinha
voltado da escola, por isso ele pôde sentir-se livre na sua viagem de
exploração do quarto. Depois de ter alcançado o seu objetivo, ficou à espera da
conquista do coração da menina. Mas não teve de esperar muito, porque foi um
amor à primeira vista. Quando a menina entrou no seu quarto, triste como
sempre, a primeira coisa que viu foi uma bola preta deitada aos pés da sua
cama. O cachorro ladrou com alegria, mexeu o rabo e correu como maluco até à
menina. Começou a lamber a mão dela e neste momento os pais ouviram pela
primeira vez há vários meses a gargalhada que saiu da boca da sua filha.
Muitas coisas
mudaram na vida da menina. O número das obrigações cresceu: tinha de sair com o
cãozinho várias vezes por dia, dar-lhe comida, lavar-lhe as patas, pentear-lhe a pelagem.
Resumindo, coisas simples e óbvias que todos os donos de cães devem fazer e que
fazem com uma cara de mártires. Porém, ela fazia-o com tanto prazer e amor, que
a pouco e pouco se esqueceu das experiências terríveis dos meses passados.
Faziam quase tudo juntos e é possível dizer que eram como unha e carne.
Finalmente tinha o seu amigo, a quem podia falar, que guardava os segredos e
que podia acariciar.
O cachorro preto
mudou a realidade inteira desta família. Os pais sentiram como se alguém lhes
tivesse mudado de filha. Graças ao cãozinho começou a sair mais de casa.
Durante os passeios conheceu outras crianças da sua idade, fizeram-se amizades.
Isto teve impacto também nas relações com os colegas da turma. Aceitaram-na e enfim
sentia-se feliz. Assim passaram os anos inocentes e ingénuos da infância. Seria
ótimo se esta história terminasse assim, com o happy end, como dizem em inglês. Mas infelizmente na vida real há
quem diga que poucas são as pessoas que consigam atingir a felicidade. Ouçam o
resto da história.
A menina transformou-se
numa rapariga e o cãozinho tornou-se um cão. Assim é a ordem das coisas. Com o
passar do tempo mudaram os hábitos, os interesses e os amigos da rapariga. Nova
escola, novo aspeto e a vida nova. Sentiu grande paixão pela moda, pelos cosméticos
e pela internet. Já não passeava com o seu cão e não acariciava à sua bola fofa.
Já nem dava-lhe a comida, tudo tinham de fazer ambos os pais. E não protestavam.
Viram que a sua filha outra vez se tornou numa pessoa diferente, mas não
reagiram. Por outra parte, ninguém observava a conduta do pobrezinho cão. Ele
já nem ladrava com alegria, nem mexia o rabo. Além disso, perdeu o seu brilho
no olhar. Cada tentativa de chamar a atenção da rapariga terminava em fracasso.
Porém, o pior ainda não tinha chegado.
Um dia, a rapariga
viu um vídeo num blogue sobre a moda, onde a protagonista tinha como o seu
animal de estimação um cão de raça pequena. Na mente da jovem floresceu uma
ideia excelente! Ia comprar um yorkie. No início os pais opuseram-se ao plano
da rapariga, mas ela, sabendo as técnicas de manipulação, conseguiu atingir o
seu objetivo. Assim, o novo membro da família apareceu em casa. Para o cão
preto isto foi como se alguém lhe esbofeteasse. A rapariga andava
orgulhosamente com o seu yorkinho na mala, levava-o para o centro comercial,
visitava com ele os amigos e familiares. Rapidamente a sua popularidade na escola
cresceu. Ela ficou muito feliz e os seus pais também. O yorkinho ganhou os
corações e a simpatia de todos. Só o cão preto ficou esquecido por todos. Não
queria nem sequer viver mais. Dormia muito, quase não se mexia, deixou de
comer. Foi o pai, que descobriu primeiro o que se passara com o cão. O veterinário
confirmou a sua teoria: o cão preto sofria de depressão. Sim, senhores. Os cães
podem ser afligidos por esta doença também.
O fim desta
história é triste. Se alguém esperava que a rapariga voltasse a cuidar do
cãezinho preto, está enganado. Os pais decidiram livrar-se do problema. A bola
preta terminou no albergue de cães. Já não era nem fofa, nem alegre. Ficou
desiludida e atraiçoada pela pessoa mais importante na sua vida: a melhor
amiga. Entregou-lhe o seu coração, mas perdeu tudo. Graças às modas dos nossos
tempos, que são a indiferença, falta de responsabilidade e trato de animais
como objetos. Contudo, as tendências seguem assim e ainda se expandem,
infelizmente para as pessoas também. Ainda ninguém te expulsou da sua vida?
Aparentemente tens sorte. Parabéns!
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